14 julho 2011

Novas linguagens

- Foi mais ou menos o seguinte, o caso lá do rapaz, o doido. Eu tava trabalhando na linha Pq. Edu Chaves que vai cortando ali pelas ruazinhas do Brás, sabe? Faz uns dois ano isso. Tava eu e o Chiquinho, um cara lá antigo na firma, um baixinho de bigode, se bobear tu já fez viagem com ele. Foi nesse dia aí que apareceu o doido. Eu falo doido assim que num sei quem era, o safado fugiu que ninguém pegava no meio do mundaréu. Era umas duas da tarde e nóis tava com o carro lotado. Naquela linha vinha muita senhora, criança, um pessoal sossegado, era raro que acontecesse algo assim. Eu mesmo nunca vi. Nem ouvi falar.
Pois foi que a gente virou uma esquina depois de pegar o pessoal no ponto e aconteceu...
- Eu vi quando ele saiu da rua de trás ali. Num tava nem prestando atenção mas o moleque tava de suspeito com um olhar desses de quem vai fazer cagada.
- Quase derrubou uma senhora, num olhava pra frente, nem pro chão, tava em outro mundo, era doido.
- Eu tinha acabado de entrar no ônibus com umas amigas pra ir pra Mooca, a gente tava atrasada e aparece um doido desses! Ai, aqui não se tem sossego menina. Vira e mexe os buêro se abre e sai essas peste pra atazanar a vida da gente.
- Já tinha visto o rapaz antes, não lembro aonde. Tipinho estranho...
- Tô zuando não Filipe! Pode pergunta pra mãe. A gente tava no banco da frente, eu tava no colo dela e vi bem quando ele correu...
Corri, de braços abertos, a sacola na mão, fiz o ônibus parar.
-Aí ele tacou...
-Ele jogou...
-O doido!
Um lançamento certeiro no pára-brisa. Foi fácil, eu tava perto.
- Espatifou no vidro.
Minha merda.
- Era merda que o moleque tacou, o doente!
Por um instante permaneci parado, sacando a reação.
- Mas que porra é essa?!
Fui ali centro de olhares, atenções.
-É merda Chiquinho!
Senti algo interessante, um comichão na palma das mãos.
Palpitava no peito. Suava todo inteiro.
- Ô sem vergonha!
Um espasmo me advertiu. Fugi.
- Segura o filho da puta!
Nunca minha merda foi tão longe.
- Doido? Nada, era artista.




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