28 março 2016

Passo

Há quem solte sua manada pela noite e ai de mim se na esquina o potro não passa de aviso da tribo como quem diz que se sigo que lide com o insólito arranhar das ferraduras no asfalto, e nem é dia ainda.
Bando de bichos grandes na rua pastando de madrugada, o jardim das casas e a grama dos buracos fracos ao mato. Sob as árvores como vulto de carne ou sob as lâmpadas como forma de bicho mesmo. O olhar parado no escuro dizendo coisas demais.
Assim esparso o fato ainda coube no que é o mundo e pôde não ser nada. Não coube foi a moldura da encruzilhada com o equino no centro simétrico baixo uma lua de móbile. Meu mundo tem limites. E vértices. E vórtices.
Um troço tão feito pra ser, essa égua à meia luz, que a rua atinge status biológico, tal qual a égua, e vejo a eternidade na sarjeta tanto quanto nas quedas onde a água diz coisas. O cimento na imagem vive. Como se a cidade importasse.
Ali, no momento, só perguntei pelo motivo ou a dica de estar o bicho. Se me apontava um caminho ou indicava que retrocedesse. O que nunca saberei.
Já em ruas menos vivas, vem-me agora esta égua alheia como única testemunha de outro quadro, um que caminha pra casa em abraço, em silêncio, pra não se esquecer.

C. P. F. - Caio Poeta Fariseu
Alavancado de Sobre o sol e o tempo

25 março 2016

Insostenible

Noticiaram  por todo o estado que o amor estava em falta. Que já não se plantava e nem se colhia. E que era melhor assim, posto que o amor era contraprodutivo. Alarmismo por todos os cantos. Um tom fúnebre em tantos relatos de falta de amor atestava seu falecimento, lançando pá após pá o esquecimento sobre a cova vazia do amor que se fora. 
E como notaram sua ausência todos, numa saudade imensa  daquilo a que nunca deram uso. E como chamaram de amor cada objeto pontiagudo e as paredes claras de seus refúgios, batizando amor ao que sempre foi abuso. E como foi tudo inútil. Posto que maquiar monstros e cantar gritos não substituísse o amor perdido, todos se perderam, para encontrar o caminho por onde o amor tinha ido. Cegos de luz e molhados de sede não escutaram  o repórter melancólico que anunciava em primeira mão o desmentido:
- Não falta amor, não falta sentido, falta quem com eles se tenha vestido. Falta dar o amor que se têm, independente do tipo, e deixar entrar o amor que vêm, por este maldito canal obstruído.

C. P. F. - Caio Poeta Fariseu
Alavancado de Velhas novas coisas.

09 março 2016

Velhas novas coisas

Vazio desnecessário
criando novas urgências;
sem carros ou gases que poluam -
Velhas novas coisas -
A vida brota em pleno fino ar

E o que a gente ganha com isso? -
Nada senão poeira das estrelas;
nada senão um pouquinho de Orion;
nada senão tudo.

tentando evitar conflitos?!
não me importo com diplomacia
sem lugar para (auto-)comiseração
destile seu veneno

Apenas seja seu melhor: seja...

(eu acabei de ver um exosqueleto num prédio - eu quero a minha supernova).


                                                                                               Zé Daniel

Alavancado de Na Lata